domingo, 25 de outubro de 2009

Deus: Criador ou Criatura?


Este é o quinto texto da série Reflexões sobre Religião. Seria interessante ler o prefácio no texto número um (Ao pé da letra).

Desde os seus primórdios, o homem cria rituais de ligação com o sagrado. Houve várias etapas na idealização de Deus, a bem dizer, vários deuses foram apercebidos até se chegar a uma concepção não antropomorfizada de Deus.

A palavra Religião vem de re-ligare: ligar de novo, no caso, o homem a seu deus. Através da religião, com seus dogmas, seus símbolos e rituais pretende-se uma reaproximação do homem com o seu criador. Não há um consenso nas várias religiões no porquê dessa suposta separação e as explicações variam de acordo com as crenças.

Há várias formas de se conceber Deus, que traçam um sentido, um rumo na vida daqueles que Nele crêem. Para alguns, Deus é uma forma de explicação para a origem do Universo; Aquele que - onisciente e onipresente - julgará a todos e decidirá o destino do homem após a sua morte; é uma força, uma energia ou a própria Natureza; é o Grande Arquiteto do Universo...Para muitos, Deus é pai.

Há aqueles que respiram Deus 24 horas sacralizando o profano e desvalorizando o real e existem aqueles que dividem o tempo entre o trabalho, lazer e oração; aqueles que se intitulam intermediários de Deus e cobram pelo acesso a Ele; aqueles que afastam as pessoas de Deus por sua visão deformada a respeito dEle e aqueles que transformam os descrentes em Seus seguidores...

Existem aqueles que - ecléticos - procuram pedaços de Deus que lhe convêm em cada religião; há o agnóstico; existe aquele que se submete - narcisista - a leis severas e, sádico, a impõe a outrem; há aquele que condena - dedo em riste ; aquele que interpreta o que considerou sagrado; aquele que dogmatiza e não pondera...; aquele que na Ciência descrê de Deus e aquele que descobre Deus através da Ciência...

O universo religioso e o des-sacralizado podem-se harmonizar ou se antagonizar. Por exemplo, uma pessoa religiosa pode ser vista como virtuosa, um exemplo para os demais e, por outros, um chato, um alienado. O problema ocorre quando alguém tenta sobrepor sua verdade às verdades de outrem: cai-se aqui na intolerância religiosa, no fanatismo, no dogmatismo e, paradoxalmente, parece que nessa hora todos vêem que essa pessoa se afastou de seu Deus...


Sigmund Freud fez uma análise interessante sobre religião. Para ele, a criação de Deus segue um protótipo infantil e filogenético. Resumidamente, o homem repete as vivências mentais de sua tenra idade com seus pais e as transfere para Deus: quando crianças tínhamos razão para temê-los (especialmente o pai); todavia, paralelamente, sentíamo-nos seguros, pois nos protegiam contra os perigos que nos ameaçavam. Deus, então, seria uma produção imaginária dos homens. Vista a impossibilidade de que um pai terreno pudesse suprir todas as necessidades de amor e proteção de seu filho, o filho cria para sí um pai ideal. Isto explicaria o porquê de, para alguns, Deus ser um pai extremamente amoroso, enquanto para outros ele é castrador, exigente das regras (a Lei) a todo instante e, acima de tudo, um pai punidor...

Friedrich Nietzsche disse:" O homem em seu orgulho, criou a Deus a sua imagem e semelhança". Não acreditar em Deus implica em admitir para si mesmo desamparo, insignificância no vasto Universo. Como superar a sensação dolorosa de não ser mais o centro da criação? Não ser mais objeto de eterno e vigilante cuidado de uma Providência Divina? Abandonar a religião assemelha-se a abandonar a casa paterna, onde há conforto e segurança...Caminhar com os próprios passos por estradas escuras e desconhecidas, sem a luz da lanterna divina, é paralisante...

Sob outro aspecto, é inegável que a religião atua como um freio moral, mas nem sempre ético...É quando ocorrem mutilações, proibições irracionais, guerras santas em nome de um Deus que mata e que é "fiel" a quem lhe retribui a fidelidade...

Há uma retórica perigosa na religião que faz com que os argumentos se afastem, pela interpretação subjetiva de alguns, dos textos sagrados. Nessa tentativa de convercer-se e convencer a qualquer preço, criam-se verdades inquestionáveis e o perfil de um Deus ditador...

Penso que as verdades religiosas são o reflexo da procura de uma verdade acima do conhecimento comum e limitado de nossa mente. Necessitamos de explicações para o que não conseguimos entender,decifrar. Esbarramos, por vezes, na razão, que não consegue entendê-las e acercâmo-nos da fé - porto seguro que nos ampara. Vejo como um real problema não a crença, a fé em Deus e sim, o esquecer-se de problematizar que o dogma incita. Agindo assim, é suficiente crer, sem saber muito porque se crê ou para que se crê.Esquecido o homem de edificar a si mesmo, qual criança a confiar nos pais, frequenta templos por obrigação, cria rituais fechados e excludentes, cria um Deus preconceituoso com os filhos dos outros...(os que não lhe são "fiéis")

É comum o fato de cientistas, particularmente na área da Física Quântica, ao começarem céticos e agnósticos suas pesquisas, tornarem-se defensores da crença em Deus. Qual o porquê dessa "conversão"? Talvez o simples fato de que fé e razão deixaram de ser vistas como antagônicas: diluindo-se o fideísmo e o racionalismo, a fé brotou distinta da razão.

Disse Kierkegaard: "Há dois meios de ser enganado. Um é acreditar no que não é verdadeiro; o outro é recusar a acreditar no que é verdadeiro". Não vou discutir aqui o conceito de "Verdade".Apenas penso que na procura da verdade, seja ela qual for, respostas nos são dadas, por vezes, quando adentramos caminhos que antes considerávamos impercorríveis. É do confronto com o adverso, do debruçar consciente sobre o incógnito que por vezes surge uma nova verdade...mais consistente, novo paradigma - amplo a ser descoberto...Nessas novas premissas descobre-se a falácia das anteriores, superam-se as antíteses, constroem-se novas sínteses...e "assim caminha a humanidade"...


Antes que me queimem nas modernas fogueiras: creio em Deus! Não sei se este Deus é semelhante ao do leitor, mas não creio que a minha verdade, a minha percepção é a única que deva ser reconhecida como real, "verdadeira"! Não imponho essa minha concepção de Deus aos outros, nem estou certa de que Ele me revelou - e só a mim - a Sua face. Nem concebo que Ele tenha uma face, pois não o antropomorfizo...

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Campanhas que eu aprovo

Gentileza Gera GentilezaDoe mais que um clique
Procure uma entidade beneficente:
Diga não ao bloqueio de blogs