domingo, 25 de outubro de 2009

Sobre o dogma


Este é o segundo texto da série Reflexões sobre Religião.Seria interessante ler o prefácio no texto número um ("Ao pé da letra").
A palavra grega "dogma" tem origem nos termos "doxa" (opinião) e "dokein" (o que se pensa ser bom). Comumente associada às religiões,pode ser definida como um pilar de sustentação de uma fé. Em termos religiosos, as doutrinas são deduzidas a partir de uma verdade revelada: negá-la implica na rejeição de um dogma. O dogma, então,é uma declaração de fé que se situa na dimensão do imutável; questioná-lo é arguir o incompreensível aos olhos infantís daquele que não crê...o que, na verdade, é um dogma na defesa de outro.

Um dogma surge de uma necessidade de construção de um edifício doutrinário; no caso das religiões, como uma forma de proteção e conservação da Palavra de Deus dada a alguém.São exemplos: a maternidade divina de Maria e sua assunção aos Céus, a ascensão de Jesus ( lembrando que a palavra assunção tem um caráter de passividade e, ascensão, de atividade), a reencarnação para o Espiritismo, a crença de que Maomé é um enviado de Alah,entre outros.

Embutida na palavra dogma encontra-se o conceito de Verdade absoluta, imutável, estática e, a meu ver, em contradição com o Universo e com Aquele que a "revelou" a alguém.Parece-me uma tentativa de prender o adimensional a uma humana dimensão.No texto número um referí-me aos males que podem advir de uma interpretação ao pé da letra de um texto - no caso, religioso. Nesse engessar de palavras, um dogma passa ao largo de qualquer interpretação literal, visto que nem mesmo pode ser interpretado, por ser uma questão de fé.Isso impede que possa ser visto como uma analogia, um simbolismo e dá margem a crenças infantís como Adão e Eva, ao choque entre práticas religiosas e científicas (por exemplo, proibição do uso de preservativos, de transfusões sanguíneas), à não-inserção na realidade contemporânea, à marginalização e formação de uma bipartição da mente que - dinâmica - não se permite presa mas, atrelada ao estático se vê na obrigação de se curvar...


Comparativamente, encontramos dogmas não só em religiões. É quando validam ideologias, quando assumem um caráter político,econômico ou científico. No campo político houve uma célebre frase que dizia: O rei nunca erra... Uma posição dogmática em Ciência, por exemplo, leva à construção de paradigmas onde não há espaço para a contestação: endeusa-se uma teoria (a "Palavra" do cientista) e abandona-se a tentativa de refutá-la (lembremo-nos que Isaac Newton ousou contestar o pensamento de sua época, dando origem ao paradigma newtoniano e, por sua vez, Einstein ousou contestar Newton, originando a Teoria da Relatividade...).Já dizia Descartes (in Discurso do Método, 1637): "O conhecimento e a ciência exigem trabalho, questionamentos sistemáticos e método.O dogmatismo é o pior companheiro da Filosofia"...

Em minha visão, dogmas são limites que, apesar de construírem e darem sustentação à uma teoria, crença, ideal - como quisermos chamar-lhes- geram contradições. No caso específico das religiões, quando ocorre a não-consciência dos seus significados simbólicos, gera-se o risco de se servir a um hábito ou tradição. Nasce um grupo de seguidores que se contentam com sequências mecânicas de atos num superficial ritualismo.Nascem repetições das quais não se entende, por vezes,sequer o que é dito,seja em missas, cultos ou outro nome que tenham as cerimonias religiosas.

Penso que arguir um dogma não deve ser considerado - hoje - uma heresia digna das modernas fogueiras que a intolerância pode construir...A adequação da "Palavra" ao contemporâneo deve servir não para destruí-la e sim, para extrair or princípios morais e culturais que ajudem a guiar o tempo presente. Quem quer estar a serviço de Deus, seja Ele que nome tenha, mais faria se não O visse como um princípio e fim estáticos, aqui inclusa a Sua Palavra...Quem quer estar a serviço de Sua Criação (leia-se homens, Ciência, Governo etc.) melhor faria se se apaixonasse pelos sentidos da Palavra retirando-lhe a conotação de verdade absoluta, para enfatizar o lado dinâmico do "re ligare" (sentido original da palavra Religião: ligar de novo, no caso, o homem ao seu Deus)...

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